A essa altura do campeonato, se você assina essa newsletter, já deve acompanhar o que eu e a Rapha falamos sobre Jane Austen. Você pode não ter escutado nenhum episódio do nosso podcast ou participado dos book clubs. Mas é provável que mesmo assim você saiba que a nossa abordagem sobre Jane Austen é baseada em nossos princípios feministas e progressistas.
Claro que não podemos falar em nome dela. Uma vez, quando publiquei um vídeo sobre ‘Jane Austen feminista’ na Conexão Feminista - um dos projetos que já fiz que me traz mais orgulho - recebi um comentário que falava algo do tipo: ‘Jane Austen era cristã e conservadora, é um absurdo você falar que ela era feminista’. O típico comentário de quem chegou de para quedas. O que acredito que não seja o seu caso.
A gente fala sobre Jane Austen a partir das leituras que fazemos, vídeos que assistimos, cursos que concluímos. Mas nenhuma leitura, vídeo ou curso é absorvido sem viés. Nós temos nossos viéses - se alguém com uma ideologia política completamente diferente da minha ler, assistir e cursas as mesmas coisas que eu, essa pessoa ainda sim, muito provavelmente, terá conclusões diferentes. Como o comentário que mencionei acima exemplifica.
Tudo isso pra falar sobre o retrato de Jane. Esse retrato que eu costumo mostrar para quem vai em algum dos nossos tour guiados, e que traz um respaldo imenso a nossa interpretação politizada de Jane. O único retrato oficialmente reconhecido dela, feito por sua irmã (quem mais poderia ser?) Cassandra em torno de 1810. O retrato decepcionantemente pequeno e inacabado, que está exposto na National Portrait Gallery, museu localizado no centro de Londres.
#3 - Que Jane Austen e sua irmã Cassandra tinham um laço além família
Nesse episódio @helorigheto e @raphaperlin falam dessa conexão forte entre as duas irmãs Austen. Conversam sobre como a maior parte do que sabemos da Jane ‘de verdade’ vem das cartas que ela escreveu para irmã. E aí, preparados para pensar sobre o que era esperado delas, como mulheres solteiras, e em uma família cheia de homens?
Apesar de ele ser a única representação de Jane que existe nesse mundo, é possível que a maior parte do público não associe essa imagem a ela. O retrato, que revela uma mulher ‘de cara amarrada’, braços cruzados, e não parecendo muito contente em ser retratada, foi distorcido.
E a distorção foi tão bem feita, que virou estampa na nota de 10 libras esterlinas. Até antes disso era esse retrato fake que habitava o imaginário de leitores.
A versão fake do retrato inventa outra Jane. Bochechas rosadas, sorridente. Uma moça boazinha, recatada, virginal, a Jane Austen que o patriarcado gosta. A Jane Austen de finais felizes. Cristã e conservadora.
Mas aqui, por trás dos romances, a gente fica com o retrato original. O retrato, a Jane Austen crítica social, observadora e questionadora. O final feliz é só pra quem não arranha a superfície.